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domingo, 2 de novembro de 2008

Luís Vaz de Camões - Os Lusíadas, Canto X, 138

Ao contrário do que alguns possam pensar, Camões refere-se a Fernão de Magalhães no Canto X, estrofe 138.

Eis aqui as novas partes do Oriente
Que vós outros agora no mundo dais,
Abrindo a porta ao vasto mar patente,
Que tão forte peito navegais.

Esta estrofe refere dois tempos diferentes. Os primeiros quatro versos - os acima transcritos - formam uma frase no presente. Ou seja, no presente da narrativa refere-se o que os portugueses têm descoberto e navegado no Oriente.

Os quatro versos seguintes, formando uma segunda frase, mudam de tempo verbal; a frase que compõem refere-se a um tempo futuro.
Ora, Cristóvão Colombo chegou ao Novo Mundo antes dos portugueses chegarem à Índia. Logo, o tempo futuro à chegada e à navegação dos mares da Índia não é a chegada ao Novo Mundo. Portanto o Poeta só pode estar a referir-se a Fernão de Magalhães, um verdadeiro português que serviu o rei de Espanha.
Tétis fala a Vasco da Gama num momento entre a chegada deste à Índia e antes do seu regresso a Portugal. Esta acção passa-se seis ou sete anos depois da primeira viagem de Cristóvão Colombo ao Novo Mundo, portanto gramaticalmente não faz sentido que a ninfa use um tempo verbal futuro para se referir a uma acção pretérita. No entanto, já é correcto que a ninfa refira uma acção que ainda está para acontecer usando o futuro e essa será a viagem de Fernão de Magalhães.


Mas é também razão que, no Ponente,
Dum Lusitano um feito inda vejais,
Que, de seu Rei mostrando-se agravado,
Caminho há-de fazer nunca cuidado.

Esse caminho que há-de ser visto, e nunca antes pensado ou cuidado, é a rota do Pacífico, pelo estreito que ficou com o nome do seu descobridor. Tomando a Europa como ponto de partida - numa perspectiva eurocêntrica, se assim se quiser chamar -, o Estreito de Magalhães fica para ocidente; tal como ficam na direcção Ponente todas as descobertas feitas no decorrer desta empresa, pois o seu rumo, grosso modo, foi de nascente para poente. Mas se em vez de se considerar a Europa como referencial das direcções, e se em seu lugar se colocar o local onde decorre a acção, onde a ninfa profetisa os sucessos futuros dos portugueses, ainda assim continua válido o mesmo raciocínio.
O Poeta disse,

Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
que eu canto o peito ilustre lusitano

e para o efeito chamou os heróis pelos nomes, nem poderia ser de outra maneira; não os ocultou, mesmo quando algum desses heróis era «Português, porém não na lealdade» como Magalhães.
Se Cristóvão Colombo fosse português, e Camões o soubesse, este não calaria o facto em 1572, pois tal já seria tão irrelevante que até um insignificante fidalgo, como ele o era ao tempo, o saberia. Mas, sabendo-o e sendo calado pela censura, então teríamos, para além de Camões, mais um ou mais uns envolvidos na conspiração colombina e sobre a plausibilidade duma conspiração envolvendo tanta gente já aqui se escreveu.

(Última actualização: 12-11-2008)

Sobre esta matéria também já se escreveu aqui.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Alucinação Total

O delírio total atingiu algumas das linhas de discussão do fórum GeneAll sobre Cristóvão Colombo e nem tudo é justificável pela total ignorância dos mais básicos conhecimentos paleográficos.
É certo que toda a discussão colombina há anos que está inquinada. Só que agora atingiu o cúmulo do ridículo. Os devotos descobriram que a Torre do Tombo tem em linha o Corpo Cronológico e vai daí atiraram-se a ele como o gato ao bofe e a asneira começou a jorrar.
Como aviso aos incautos e aos distraídos declara-se aqui que a leitura feita no referido fórum dos documentos TT-CC-2-1-41 e TT-CC-2-1-42 é totalmente fantasista e não tem – até agora – nada de verdade.
Os documentos são escritos em português; não têm qualquer caracter grego (mas têm numeração romana medieval); não referem qualquer Cristóvão Colombo (ou suas variantes pseudo-históricas); não referem nenhuma Filipa Moniz; não referem nenhum Moliarte... em suma: alucinação integral.

Transcrição: Cento arrobas

(Por baixo está simplesmente um rabisco a trancar a página.
Não está, pois, um alfa rodado. Quando muito seria um gama (muito se gosta de complicar!).

Depois de manifestada tanta ignorância ainda há quem tenha a desfaçatez e a coragem de para criticar historiadores e fontes?

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Uma burguesa no mosteiro de Santos

A experiência continuada de investigação, trabalhando-se com documentação cronológica e tematicamente diversificada, dá a quem a faz uma sensibilidade especial para avaliar o que pela frente se lhe depara. O investigador novato, o estudante, mesmo que teoricamente bem formado, e ainda mais o amador facilmente se maravilha e sobrevaloriza coisas vulgares que mais tarde, já veterano, o levam a sorrir pela ingenuidade então demonstrada. Esta experiência dá-lhe também a humildade para reconhecer as diversas limitações a que está sujeito e lembra-lhe a necessidade constante de reflectir sobre o método e a teoria da sua arte.
Foi tudo isto que pesou no que aqui escreveu o nosso colega e amigo P. R. quando disse que não tinha lido nem leria uma determinada obra, baseado unicamente no que lera em diversos outros locais sobre as questões em causa; foi tudo isso que também pesou quando eu aqui comecei a escrever sem ainda ter lido um determinado livro. Não estou arrependido nem, assim o julgo, o meu amigo P. R. o está.
Reflexão teórico-metodológica feita, passe-se ao sumo deste texto.
Numa pausa do trabalho normal na TT procurei um dos documentos referidos por Manuel Rosa relativos a Filipa Moniz. Se a referência não está errada pelo menos está incompleta e a falta de tempo para estes assuntos secundários não me possibilita uma pesquisa mais aturada. Assim lancei a rede para ver o que nela cairia e o resultado, não sendo o procurado, acabou por ter o seu interesse pelo valor pedagógico que terá para os admiradores das ideias que postulam um Cristóvão Colombo português.


TT, Mosteiro de Santos-o-Novo, Doc. 521 (Antigo Mç. 22, n.º 521).

Edição Paleográfica - Excertos
(…)
Em nome de Deos Amen Saibão todos que na Era de mil e quatrosentos e seis anos comvem a saber vinte dias do mes de Janeiro em logo que chamão Palma da par da çidade de Lisboa em huma quinta que em outro tempo foi de Goncallo Gil Palha e depois de Vasqu’Eanes mercador vezinho e morador na dita çidade no Adro de São Nicullao a qual dezião que o dito Vasqu’Eanes hi ouvera e lograra a merce da ditta quinta que lhe della fora feito per el-Rei dom Afonço per rezon que o dito rei mandara filhar e vender a ditta quinta ao dito Goncallo Gil em prezensa de min Domingos Afonço tabalion del-Rei na dita çidade e testemunhas ao diante escriptas [espaço em branco] procurador-geral do mosteiro de Santos da par da dita sidade procurador espesial que ser mostrou de Margarida Vasques dona profesa do dito mosteiro filha lidima e erdeira do dito Vasqu’Eanes e de Sancha Rodriguez sa molher per poder de huma procurasão escripta he asinada per min o dito tabalion que contava que fora feita no dito mosteiro de santos por lisença e outorgasão de dona M[ai]or Pires comendadeira e doutras muitas boas donas e convento do dito mosteiro todas juntas e chamadas a conselho per campa tangida segundo he de seu costume espesialmente pera esto que se a diante segue doze dias do sobredito mes e era na qual era conteúdo amte outras cousas que a dita Margarida Vasque[s] per poder da ditta lisença fez e ha estaballeser per seu procurador (…) que per ella e em seu nome possa pedir demandar e reseber procurar e mostrar e pedir demarcasois (...) e sobre qualquer couza e posesois e novos e rendas de pão que delles naserão e desenderão [espaço em branco] remetir e pera dar per quites e livres (…)

*
Este excerto foi transcrito dum documento que diz ser uma pública forma feita em 2 de Janeiro de 1636 duma procuração passada em 12 de Novembro de 1368 por uma residente no mosteiro de Santos. Na realidade trata-se duma cópia simples e incompleta, com valor meramente informativo, seja porque o escrivão teve dificuldade em ler o original do século XIV, seja ainda por o pergaminho se encontrar em mau estado, ou ainda porque o cliente acabou por se satisfazer em saber só o conteúdo do documento. Seja como for, o contexto arquivístico em que o documento se encontra parece, à primeira vista, conceder-lhe autenticidade quanto ao conteúdo.

Este documento ajuda a desmistificar duas afirmações da pseudo-história colombina.
Postulado pseudo-histórico: O mosteiro de Santos albergava senhoras da mais alta-nobreza.
Realidade histórica: Como se pode ler, Margarida Vasques, «dona professa» do mosteiro de Santos, é filha do mercador Vasco Eanes e de sua mulher Sancha Rodrigues.
É verdade! A filha do mercador é «dona professa» do mosteiro de Santos. Nenhum deles (pai, mãe, filha) é dom. E a filha dum mercador não é da mais alta nobreza, nem tampouco nobre, é… plebeia.
Conclusão: Dona Maior Pires, comendadeira do mosteiro de Santos, dá licença e outorga a procuração que Margarida Vasques passa. Repare-se que só a superiora tem o título de dona antes do nome, um título que, se mais não for, é inerente ao cargo que ocupa. Também no documento anteriormente transcrito há a distinção entre donas e não donas de direito pelo uso que se faz do título antecedendo os respectivos nomes.
Postulado pseudo-histórico: É invulgar a existência de espaços em branco na documentação e estes ocultam factos que se querem esconder.
Realidade histórica: Só neste documento ocorre duas vezes o espaço em branco. A primeira onde deveria figurar, pelo menos, o nome do procurador-geral do convento de santos e a segunda deveria enumerar um, ou mais, dos muitos poderes delegados no procurador. São situações que resultam, muito provavelmente, do facto do escrivão do século XVII não conseguir ler o que foi escrito no século XIV, fosse por dano no documento fosse por limitação própria a nível da paleografia. O espaço ficou em branco para preenchimento posterior se alguém conseguir ler o que lá está ou souber que lá deve figurar.
Conclusão: Porque a existência de espaços deixados em branco no meio dum texto ocorrem com alguma frequência, o historiador não sente grande estranheza quando estas se lhe deparam. Contudo, perante elas não se sente autorizado a enveredar por especulações delirantes, como aconteceu ao romancista José Rodrigues dos Santos seguindo outros amadores da investigação histórica que antes dele pasmaram diante da palavra «italiano» num espaço previamente deixado em branco na crónica de Rui de Pina.


Adenda: Um exercício útil seria fazer neste manuscrito o levantamento de todos os espaços deixados em branco e preenchidos posteriormente.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

O “antes de ser já o era”


Gosto das coisas simples e claras.
Como é que Filipa Moniz pode ser dona?
O título de dona pode ser recebido por doação régia, por inerência de cargo, por via paterna ou por casamento - passo à frente outras hipóteses.
Não conheço nenhum instrumento de doação régia ou de atribuição de cargo a Filipa Moniz. Restam-nos assim as duas últimas possibilidades: em que aquela recebeu o título de dona por ser filha dos Perestrelos ou por ser casada com Colombo.
Os Perestrelos receberam o título de dom em 1522 e Colombo recebeu o mesmo título dos Reis Católicos depois de voltar das Antilhas quando já era viúvo e tinha reconstituído a família.
Filipa Moniz só se tornaria dona se estivesse viva na altura em que o marido se tornou dom ou na altura da aplicação do instrumento do título de dom aos Perestrelo. Só com muito boa vontade e largueza de interpretação jurídica se pode considerar que o título de dom concedido aos familiares de Filipa se lhe aplicaria depois de décadas no túmulo.
O filho de Colombo ao dizer que Filipa era dona só revela a sua parcialidade e vontade de ilustrar a família. Claro que lhe convinha que Filipa fosse da mais alta nobreza, contudo o que se sabe é que os Perestrelo eram originários da burguesia - e este grupo pertence à ordem do povo, ao mais alto estrato do povo, mas do povo.
Os Perestrelos ascenderam à nobreza no início do século XV, mas até lá eram burgueses com privilégios régios. Trata-se dum caso de ascensão social em relativamente poucas gerações. O mesmo se passa em relação a Colombo: um agente comercial de firmas italianas que mais tarde resolve ir em busca da Índia por ocidente e se torna almirante com títulos régios de nobreza.
Entre o testemunho de Fernando e o instrumento de emprazamento é de valorizar o segundo pois é o mais imparcial do ponto de vista da crítica histórica no que se refere à não intitulação de dona por Filipa Moniz. Neste último documento não há qualquer intenção ou motivo para alterar a realidade social. No emprazamento o escrivão mencionou sempre quem eram as outras senhoras envolvidas e quem de facto era dona.
De qualquer forma, Filipa Moniz, não é como a pescada que antes de ser já o era.

quinta-feira, 8 de março de 2007

São Cristóvão Colombo, e o Santo Graal na Cuba do Alentejo

O Santo Graal (13)

Na esteira do sr. Manuel Rosa, o sr. Carlos Calado reafirmou recentemente (1) que nós Pseudo-História Colombina alguma vez escrevemos que o italiano Colombo tivesse sido o tão famigerado tecelão da cidade de Génova encontrado no sc. XIX pela historiografia italiana dita purista. É consabido que bem pelo contrário, desde o início das nossas intervenções neste blogue, chamámos a atenção para o facto de que o nome Cristóvão Colombo era em Itália quase tão vulgar como entre nós o do grande António Silva... e que lemos que se documentam em Itália, coevos seus, vários Cristóvãos Colombo, sendo que o condottiero corsário depois ao serviço da coroa castelhana poderia nem ser algum deles, mas outro qualquer de que não restasse, ou se desconhecesse documentação italiana, antes de ter ficado conhecido o mercenário fora da sua pátria.

Mais absurdamente ainda, em Génea Portugal, lemos o sr. Manuel Rosa queixar-se de que "agora que ele denunciou que Colombo não era o tecelão, querem roubar-lhe a descoberta e vir dizer que a tinham afirmado publicamente antes dele"... Citamos de cor este seu espantoso desabafo, pois infelizmente não marcámos a página aonde se encontra registado, algures dentro da embrenhada colombina selva dos disparates que corre naquele fórum...

O sr. Manuel Rosa, como sabemos, dizia ter estudado quinze anos a temática colombina, depois por ele próprio rectificados para quatorze nas páginas deste nosso blogue o ano passado, e, finalmente, aqui mesmo confessando em momento de franqueza expansiva terem sido apenas treze os anos consagrados a esse esforço, voltando agora no entanto a publicamente referir, impávido sempre, decerto em boa fé, os famigerados quinze anos (3) demasiado incompletos a nosso ver, talvez por serem número esotérico ao qual não queira ou não o deixem já fugir a incoerência... ou considere não ser de bom augúrio o número treze. O sr. Rosa, dizíamos, que tanto se ufana de ter lido e coligido a maior bibliografia de sempre sobre Colombo, necessita em nossa opinião de ver bem se essa bibliografia estará completa... pois que na realidade, tal como já tínhamos avançado ab initio, o sr. Rosa sempre deliberadamente ocultou, nos dois últimos anos em que o lemos quase diariamente, as várias teses anti-puristas italianas de que já em tempos nos ocupámos, e que revêm à luz documental a génese italiana de Colombo, considerada cronologicamente incompatível com a do Cristóvão Colombo tecelão... Ora esses estudos históricos italianos anti-puristas têm já vários anos, e estão amplamente divulgados, até na Rede, e não cremos portanto que o sr. Rosa saisse a terreiro na "Ibéria", (10) como gosta de dizer, sem deles ter conhecimento...

Apenas, sabendo nós como o sr. Rosa ingenuamente gosta de chamar a si as descobertas e enunciados alheios, anunciando-os ingenuamente como seus, cremos que não lhe convinha referir os estudos total ou parcialmente sérios existentes em Itálias na área colombina, a fim de poder passar melhor a sua disparatadíssima tese de um Colombo português reapresentado ademais com sobrenome castelhanizado!

Ora como a insegurança, a ignorância e a inocência seguem o publicado recente, ou na moda, vemos cada vez mais pessoas lusófonas na Rede a singularizarem-se adoptando a nóvel ridícula denominação de Colombo oficializada interesseiramente pela Câmara da Cuba diante dos seus Paços do Concelho: "Colon"... Por este facto responsabilizamos inteiramente os srs. Mascarenhas Barreto, Rosa, Calado, e sobretudo a Câmara de Cuba,na pessoa do seu presidente sr. Orelha, que é de todos a única entidade, porque oficial, que nunca se poderia permitir tamanho dislate e atentado à verdade historiográfica documentada.


Mas voltando ao Colombo frio, apesar de os seus próprios seguidores já terem chamado a atenção de Manuel Rosa que nós próprios nunca indicámos outra coisa senão essa verdade documentada, ou seja, que Cristóvão Colombo era lígure, natural dos Estados de Génova, e portanto italiano, continua a ser divulgada a mentira, que lhes seria conveniente que fosse verdadeira, de nós defendermos a tese do tecelão, o que nos pareceria tão pouco adequado como defender a tese catalã, a galega, a grega ou outra qualquer... antes de termos terminado de as estudar, e podermos pronunciar-nos com a isenção necessária, conforme prometido aos leitores do Pseudo-História Colombina. E temos até ideia de já nestas páginas termos referido que o ponto mais fraco da argumentação a favor do Colombo da cidade de Génova é a incompatibilidade cronológica aparente da documentação deste com a biografia conhecida e documentada do aventureiro genovês. Não o facto de ter nascido eventualmente burguês e plebeu... como querem os pseudo-históricos portugueses, que tanto gostam de mitificar a Nobreza de Portugal, distinta das restantes nobrezas europeias na sua idiosincrasia, e que tão mal estudada trazem.

Aproveitamos aqui para um esclarecimento que julgamos útil aos crentes fundamentalistas das teorias esotéricas portuguesas sobre Colombo: estes dois colombistas portugueses, no seu espanto de que a historiografia portuguesa coloque geralmente Colombo no seu verdadeiro papel, e importância, fora da mitificação que lhe atribuiem as historiografias castelhana, italiana, e norte-americana tradicionais, entendem por isso que todos os historiadores portugueses acharam por bem debruçar-se atentamente sobre o mero pormenor histórico que são as origens intra-italianas de Colombo. Na realidade, tal como nós já havíamos avançado, cabe sobretudo à historiografia italiana a necessidade de se interessar, reestudar, e reapresentar o primeiro periodo colombino, antes dele sair de Itália, depois de expurgados erros documentais e interpretativos criados pela história nacionalista de Oitocentos. E a historiografia portuguesa tem muitíssimo mais com que se ocupar do que entrar na guerra colombina sobre as origens familiares de Colombo, tão avidamente disputado entre Castela, a Catalunha e a Itália por não
disporem de outros navegadores oceânicos de renome mundial, como também já aqui havíamos dito.

Quanto ao sr. Carlos Calado, e à crítica que nos tece, deixa-nos estupefactos, na medida em que temos vindo a ser acusados pelos rosistas e cubanistas colon'iais de ser elitistas, e de menosprezarmos qualquer trabalho de investigação que não seja académico... Na realidade, desprezamos sim é trabalhos de investigação quando elaborados sem ponta por onde se lhes pegue, com desprezo da Razão, dos documentos válidos coligidos, e sobretudo do bom senso! E isto, ou a falta disto, pode existir e existe decerto até dentro de pessoas com graus académicos em História, e não existir em alguma investigação séria e independente, completamente louvável. O preconceito, obviamente, parece encontrar-se sim em quem nos acusa, ao escrever "...Esta tese do Colombo “não necessariamente tecelão” foi, como se esperava, iniciada por um genovês de nome Vittorio Giunciuglio, simples operário reformado que escolheu a história como hobby. Claramente um distintíssimo membro da comunidade científica tantas vezes invocada como júri da verdade. É esta tese perfilhada pelo pseudo blog..." (1).

Ora nós nunca tínhamos sequer ouvido falar em tal nome, que nos recordou o da gentil Gigliola Cinquetti dos anos sessenta pela dificuldade da sua pronunciação. Mas facilmente o encontrámos na Rede, realmente pintando Colombo cheio de teorias conspirativas neo-templárias, eventualmente romãs, mistérios indocumentados, espíritos revelados, lógicas por desvelar, e muitas outras coisas tão ao gosto sim do sr. Calado e do sr. Rosa... o que nos espanta é que alguém que tem um grau em Marketing, entre outros, e alguém que apoia a ridícula e mentirosa oficialização em bronze municipal de teses há muito desmontadas e ridiculizadas pela comunidade científica portuguesa, e por qualque pessoa de mero bom senso, atreverem-se agora a vir ridicularizar publicamente um seu colega italiano, de nacionalismo esotérico apenas comparável em Portugal à cena colon'ial perpetuada para turista ver diante da Câmara da Cuba, com a bênção socrática do punho fechado rosa actualmente no poder...

Armas de Inocêncio VIII
Faiança de Lucca della Robbia

Pois que realmente, atente-se, declarar o cruel ou implacável genovês "São Cristóvão Colombo" (4), como pretendem alguns mais fanáticos dos da Pseudo-História italiana, indignando-se por dois papas lhe terem recusado uma canonização política no sc. XIX, não é menos disparatadamente nacionalista do que defendê-lo como português natural, e filho de infantes, e Colonna de sangue, e outras patacoadas que tais. Começámos então a entender os actuais receios eventuais dos colon'iais lusitanos - o receio de que a estátua a Cristóváo "Colon", de castelhano bronze fundido em Madrid, tal como o renomeado Colombo ali representado, perdesse para alguma estátua a São Cristofero Colombo erigida em Itália... E nesta nossa divertida busca, fomos ter a Ruggero Marino (6), deixando apenas de parte a afirmação hebraica para Colombo, que já não tivemos tempo nem paciência para investigar.

Procurámos então encontrar qual a razão porque alguns escritos ligariam este referido jornalista e historiador pseudo-histórico (5) ao pouco inocente e prolífico Inocêncio VIII. Ao autor da bula "Summis desiderantes affectibus", que confirmando oficialmente em 1484 a existência da bruxaria como algo de essencialmente feminino e ligado à Heresia deu origem a nova e longa, misógina caça às bruxas na Europa, perseguição que vitimou essencialmente mulheres com sabedoria naturalista popular, por mera superstição dos seus perseguidores. Ao papa concessor do título de "Católico" ao rei de Aragão e Castela Fernando V.

Inocêncio VIII

Sobre um Inocêncio VIII eventualmente ligado a um financiamento da primeira viagem de Colombo, encontrámos uma curiosa carta (2). Ignoramos se verdadeira, está publicada numa página histórico-esotérica italiana, aonde o conceituado historiador semi-oficial nacionalista Taviani não recusa a existência de um documento referindo ou indiciando esse assunto - carta que precedeu necessariamente os extrapolamentos esotéricos que logo em seguida levaram a severas críticas da historiografia italiana sobre Marino, e parece que também sobre o desprezado operário referido depreciativamente pelo sr. Calado. Não lemos nem um, nem outro... Interessa-nos apenas o documento, sua veracidade eventual, e existência factual. Evidentemente que não duvidamos que a carta de Taviani a Marino seja apresentada isolada, e fora de contexto, para fins menos claros posteriores à sua escrita.

Repita-se agora, forçando os sorrisos, que estas teses, que correm a Internet, declaram Colombo como São Cristóvão Colombo, filho ilegítimo do Papa... Com papa tão corrupto, carecendo de dinheiro até ao ponto de criar cargos novos apenas para os vender, e um "filho" tão cruel, como ambos se documentam face à História, a santidade precisará a nosso ver estar mais com o leitor paciente, do que com os Cibos, verdadeiros e alegados...

Jazigo de Inocêncio VIII

Inocêncio VIII tomou ordens já com filhos naturais reconhecidos, tratados como tal na corte papal, sendo todos os restantes que lhe nasceram abundantemente de várias mulheres depois de sacerdote tratados, ao jeito do habitual nepotismo da época, como sobrinhos. É até costume referir que João Baptista Cibo é um dos pais biológicos de Roma. Apesar de ter crescido na corte napolitana, a sua origem genovesa parece ter-lhe sido realmente importantante, visto ter usado nas suas armas a cruz de S. Jorge genovesa em cima do brasão dos Cibo, e ter adoptado ao ser eleito o nome Inocêncio em homenagem a outro papa de Génova, Inocêncio IV.

Pareceu-nos que a principal falsa pista em que se baseia o sr. Marino para presumir missões secretas de Colombo à América, e uma sua chegada ali antes de 1492, seja a má compreensão do panegírico inscrito no túmulo de Inocêncio VIII existente em S. Pedro, túmulo realizado pelo Pollaiolo em 1498, que leu sem lhe entender o contexto, decerto. Diz este letreiro:

"D.O.M. / INNOCENTIO VIII CYBO PONT. MAX / ITALICAE PACIS PERPETVO CVSTODI / NOVI ORBIS SVO AEVO INVENTI GLORIA / REGI HISPANIARVM CATHOLICI NOMINE IMPOSITO / CRVCIS SACRO SSANCTAE(sic) REPERTO TITVLO / LANCAE QVAE CHRISTI HAVSIT LATVS / A BAIAZETE TVRCARVM IMPER (ATORE) [ldepois riscado e corrigido por] TYRANNOI DONO MISSA / AETERNVM INSIGNI / MONVMENTVM VETERE BASILICA HVC TRANSLATVM / ALBERICVS CYBO MALASPINA / PRINCEPS MASSAE / FERENTILLI DVX MARCHIO CARRARIAE ET C. / PRONEPOS / ORNATIVS AVGUSTIVSQ. POSVIT ANNO DOM. MDCXXI".

Traduzimos o início - Deus, Óptimo, Máximo/ Inocêncio VIII Cybo pontífice máximo/ custódio perpétuo da paz itálica/ glorioso inventor no seu tempo do Novo Mundo/ impositor do nome católico ao rei hispânico/&. Ora o "mistério" consiste para Ruggero em que Colombo partiu para a sua 1ª viagem de mercenário oficial em 1492, justamente quando este papa morreu, e daí atribuir-lhe Marino a encomenda e financiamento parcial da viagem, e o conhecimento anterior de outra viagem não-oficial de Colombo ao continente americano antes dessa data. Assim, Cristóvão Colombo é dito seu filho... com Anna Colonna (4), cronologicamente uma madura senhora de quem o púbere João Baptista, bem longe ainda de sonhar vir a ser papabile, o teria tido aos quatorze anos de idade. O "filho" da senhora Colonna e do Papa iria pois à América buscar o oiro necessário a seu "pai" para efeito da nova guerra de cruzada contra o turco requisitada por este à Cristandade...

Ruggero Marino, e eventualmente Vittorio Giunciuglio, ao levar em conta quanto reza este epitáfio, não souberam historiar e enquadrar a feitura do mesmo... Com efeito, ali a parte final informa-nos que o dito foi mandado escrever (parte do letreiro, inclusivamente, riscada e reescrita por cima posteriormente) pelo bisneto do Papa, Alberico Cybo Malaspina, príncipe de Massa, duque de Ferentilla e marquês de Carrara (7), no tardio ano de 1621, 123 anos depois da morte do papa Cibo, quando mandou trasladar para a nova basílica de São Pedro o túmulo de seu avô que se encontrava antes na demolida basílica medieval. Este monumento funerário é aliás o único entre os de todos os papas que gozou do privilégio de ser transferido da basílica velha para a nova, talvez em atenção a este seu bisneto, ou ao facto deste ter suportado os custos associados.

Evidentemente, e dentro da tendência de exaltar o bisavô, expoente máximo da glória da sua Casa, o velho príncipe de Massa, já no fim da sua vida, ou algum dos seus fâmulos terá feito confusão histórica, talvez por má compreensão do epíteto Católico dado ao Fernando V rei de Aragão e Castela (12), ou por vontade de ligar o antepassado à chegada castelhana à América, fonte dos proventos metalíferos que haviam permitido aos reis Habsburgos de Madrid alcançar o topo do seu poder que então apenas iniciava a decadência. Assinale-se que o túmulo do Pollaiolo é o primeiro sepulcro papal conhecido em que o morto, além de representado jazente, é figurado também sentado em trono, figurativo do seu poder temporal elevado à majestade temporalizada do sólio pontífício.

Motivados ainda pelos esotéricos dizeres do sr. Calado a respeito do genovês Inocêncio VIII, no século João Baptista Cibo, fomos investigar a etimologia do seu sobrenome - que em italiano se lê "Tchíbò" - confessando que esperávamos encontrar significado igual ou parecido para chibo, jovem cabritinho como se sabe, dada a semelhante pronúncia das duas palavras, italiana e portuguesa. Mas não: a palavra cibo parece ter sido usada em Itália passando a designar a quantidade de comida necessária para pagamento de uma jorna de trabalho agrícola avulso... Cibo - lê-se "sibo", escrevendo-se igual - é palavra que existe em português como em italiano, e na nossa língua usa-se hoje em dia para designar um bocadinho de qualquer coisa, por exemplo pequeninas doses de ração, especialmente as que são dadas às aves. Mas (vede só o perigo...) cibo é nome que chegou ao latim oriundo do grego (valha-nos Deus, lá vem membro!).

Designando inicialmente como dissemos a ração de alimento a ser fornecida a pequenos animais, passou cibo a designar depois pequenos vaso de barro aonde esta lhes era fornecida, e suspeitamos que esses vasos pudessem ser cúbicos... :) Recorrendo então ao habitual diccionário Priberam em linha, verificámos que cuba e cibo têm etimologia diversa, embora ambas designem recipientes, vindo Cuba do latim cupa, que depois dará copa (outro nome de taça) e copo. Pelo que o sr. Calado pode ficar sossegado, não terá que ligar a sua terra ao papa "templário" que trouxe à baila, a não ser que este por alguma forma tenha estado ligado ao cultivo das romãs. É pena... uma estátua de Inocêncio VIII não substituiria mal a de Colombo que recentemente colocaram em praça, visto não quererem ali colocar o alentejano Gama...

A terminar, pensávamos nós que os srs. Rosa e Calado teriam entendido, depois da conferência na Sociedade de Geografia de Lisboa do Doutor Contente Domingues, que para a historiografia portuguesa a questão das origens exactas de Colombo relevam do mero pormenor com algum interesse, e não são questão fulcral com que tenha de se ocupar prioritariamente... Mas enganámo-nos, diante deste texto... que revela ao Mundo que Nosso Senhor Jesus Cristo nasceu hebreu! Quem diria...

Infante D. Fernando

Parafraseando o sr. Rosa, há que exigir provas de tamanha afirmação! Sugerimos portanto aos srs. Rosa e Calado que escrevam ao seu esotérico colega em espírito, Giunciuglio, a fim de lhe exigirem as evidências documentais de que Jesus nasceu judeu, e pelo caminho sempre podem aproveitar para lhe perguntar se saberá explicar a presença de romãs esculpidas na porta da capelinha da Cuba.

Sobre este assunto, adiantamos uma sugestão a jeito de prémio de consolação à ainda por descolon'izar Cuba do Alentejo: Já que com muita pena nossa ali não nasceu o Salvador, trazemos-lhe hoje por alvíssara a descoberta de que agora há quem afirme (8) que se guarda na dinamarquesa ilha de Bornholm o tão procurado Santo Graal... ali depositado pela extinta Ordem do Templo. Mas que pela nossa pesquisa do radical etimológico do nome da Cuba, afigura-se-nos essa crença um impossível, e que o conteudo do Cálice por todos desejado mas só acessível a Galaaz se encontrará decerto em solo cubense, ali depositado pelo Infante D. Fernando, duque de Viseu e de Beja, administrador das ordens de Cristo e de Santiago, como no-lo-prova à evidência o seu nome de Cuba, ou Taça, que sabemos único na geografia europeia.

Acresce que as próprias armas do concelho (11) ainda hoje aludem a este misterioso facto: usam basicamente as cores verde e oiro, as cores pessoais da dinastia de Aviz. Temos ainda a púrpura, pelo espírito, e o vermelho, pela matéria. São quatro as espigas, número da terra, e dois os cachos, revelando a dualidade a esta associada no seu movimento inferior receptivo e gerador de forma para o espírito manifestado; e uma única a haste de oliveira, aludindo à unicidade tríplice do Agnus Dei, ou Cordeiro da Paz, primeira pessoa da Santíssima Trindade. As espigas ali estão pelo trigo do pão ázimo de que é feita a Hóstia, e a uva tinta está pelo sangue do Redentor contido no Graal. O laço, símbolo dos Iniciados de Amor desde pelo menos os tempos de Joaquim de Flora, e já cantado pelo Dante, é encarnado, representando a libertação humana do Desejo e da prisão da Carne pela transcendência da união mística com o Cristo, na unidade do Espírito Santo. Quem sabe se os cubenses, escavando junto à Capela das Romãs, não irão encontrá-l'O, e com Ele diante, possuir finalmente o verdadeiro e único Salvador dos Homens (9) ...

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1) Estrambólica crítica do sr. Carlos Calado ao Pseudo-História Colombina, que republicámos já nos comentários ao nosso post "Alucinações".
2) Algumas das teses pseudo-históricas italianas actuais consideram Cristóvão Colombo filho ilegítimo, para variar... "misterioso" e "secreto", do corrupto papa. Não entendemos porque S.S. o teria secreto, quando assumiu e estableceu rica e poderosamente todos os seus numerosos outros filhos espúrios... Lá como cá, desejam testes de ADN a fim de poderem provar que Colombo era um Cibo...
3) Cf. Quinze anos é muito tempo.
4) Evidentemente, os defensores de "Sâo Cristóvão Colombo" filho "secreto" do papa Inocêncio VIII em missão da Igreja Católica para tomar posse oficial do Novo Mundo, também o declaram, ora não, templário, e, claro, dão ao "Kolon-membro" uma mãe Colonna, Ana Colonna, essa documentada como mulher madura quando o pai suposto, Gianbattista Cybo, teria apenas quatorze anos... Supomos terem lido sem o citar a Mascarenhas Barreto... ou nacionalizando as teses de Barreto ao sabor do seu interesse pelo mistero-spaghetti.
5) Nunca lemos, entrevimo-lo apenas em linha para efeitos deste artigo, e bastou. Trata-se de um jornalista que durante as comemorações colombinas de 92 foi severamente criticado pela historiografia italiana devido às suas teses pseudo-históricas colombinas não menos mirabolantes do que as portuguesas.
8) Em "The Templar's Secret Island" (A Ilha Secreta dos Templários), livro pseudo-histórico de 194 páginas escrito pelo dinamarquês Erling Haagensen em parceria com o inglês Henry Lincoln, é apresentada a teoria que o Santo Graal e a Arca da Aliança provavelmente foram escondidos pela Ordem dos Cavaleiros Templários na ilha de Bornholm, no Mar Báltico, há cerca de 830 anos atrás.
9) Esta nossa pseudo-história cubense está tão bonita e coerente, que até já nós acreditamos nela... Que não no-la ousem rebater! Iremos submetê-la à apreciação da Fundação Alentejo Terra-Mãe... quem sabe!
10) A Península Hispânica, mesmo depois de redenominada Ibérica, graças a Deus ainda não constitui um único mercado de informação, apesar do tradicional imperialismo cultural e económico castelhano, disfarçado sob o nome de "espanhol", com tendência a ser seguido pelas grandes multinacionais.
11) As armas da vila de Cuba sob o regime republicano são: escudo de verde com um ramo composto de quatro espigas de trigo de ouro e uma haste de oliveira de verde florida de prata, tudo atado de vermelho. O ramo acompanhado por dois cachos de uvas de púrpura e sustidos de ouro. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco com os dizeres : " VILA DE CUBA ", de negro.
12) Por eventualmente associar a concessão ao rei de Aragão como fruto da descoberta oficial da América, e não, como efectivamente aconteceu, pela conquista definitiva do reino de Granada.
13) O Graal é uma lenda alegórica medieval com origem céltica, melhor estruturada depois do sc. XII e que precedeu o conceito moderno de Sagrado Coração de Jesus, podendo ser correlacionado o seu significado com o ensinamento religioso oriental relativo ao 4º chakra, assim como ao indiano Krishna e outros avatares. Procura sistematizar Sabedoria teológica.
Neste ícone ortodoxo encontramos uma mandala cristã perfeita: vemos uma Virgem Negra coroada, vestida de azul e encarnado, bordado de estrelas de oiro do Céu o pano azul, e de folhas doiradas da Terra o tecido vermelho, simbolizando estas cores a dualidade do feminino puro desdobrado e presente potencialmente no Espírito, e concretamente na Matéria, respectivamente. As mãos de Nossa Senhora, de pele negra por mero simbolismo da Morte que é a Matéria para o Espírito, porque de feições inteiramente caucasianas, encontram-se completamente abertas e receptivamente levantadas para o Alto, e ao mesmo tempo como que abraçando e abençoando quem a contemple, em gesto de Paz. O seu resplendor circular vazio de raios sugere este ser receptivo à Luz divina, e não irradiadora da mesma, como se vê no do Seu Filho. Também o campo vazio da sua auréola, mais sugerida do que pintada, não contém qualquer cruz, como a do Filho, mas apenas a coroa de quatro florões trilobados e dois aros divergentes, mostrando o quatro da matéria elevada na dualidade chamada a reinar sobre o plano físico, aqui presente na densa cor encarnada do toucado por sobre a coroa, também ele decorado com duas áureas flores espirituais. Os dois aros emergentes do diadema fechado divergem a partir de um aro único ascendendo desde a base da coroa da Senhora, e mostram-nos a separação do Uno em Dividido que permite a reprodução.
A Mãe Divina representa aqui principalmente o feminino telúrico e o inconsciente oculto, sobreposto e alinhado o seu coração ao do andrógino Menino Salvador contido dentro do Cálice do Santo Graal, que por sua vez figura a Transubstanciação redentora que Cristo veio exemplificar ao Homem. A Taça assenta em cúbico sacrário, guardião do mistério da Eucaristia, e este está assentado no trono tradicionalmente atribuido pela iconografia medieval a Deus Padre, assim presente aqui apenas invisivelmente.
O Cristo está pintado com uma auréola de energia doirada circular, símbolo da Perfeição do Amor Divino a quem se Lhe reuniu e O irradia agora conscientemente para todos os Seres. O círculo da Sua auréola contém uma cruz, símbolo da dolorosa tensão da Matéria da qual se libertou apenas pela morte da Sua condição humana inferior pela fecundação do Espírito a quem uniu a Sua vontade; e esta auréola de Luz e o Seu corpo encontram-se contidos num semi- resplendor de Luz Divina, de forma oval, chamado mandorla. A Mandorla alude aos ciclos da Manifestação do subtil Divino esférico na grosseira Matéria cúbica, movimentando-se a Vida espiraladamente pela tensão existente entre a força da inércia yin e a força actuante yang, conformes ao conceito espiralado grego do Tempo. E contido este entre o Princípio e o Fim do movimento do Espaço pluridimensional, entre o Alfa e o Ómega, a primeira e a última letras do alfabeto grego que isso mesmo simbolizam, e se encontram aqui uma de cada lado do Cristo Graal como Centro do Grande Ciclo Único Inclusivo e Exclusivo, Ascendente e Descendente, Evolutivo e Involutivo, manifestado em espiral por sucessivos subciclos repetitivamente diferentes, alinhados e reunidos pela imaginária linha recta interna reunindo os centros entre Alfa e Ómega. Linha essa que simboliza o irreal tempo linear circunscrito ao limitado plano dos cinco sentidos, e por isso mesmo representada aqui horizontalmente ao nível da cabeça do Cristo.
O Espírito Santo encontra-se presente na Pomba descendente, mostrando pelo merecimento da Graça alcançada pela Pureza a fecundação espiritual da Virgem pelo invisível Pater, ou Fonte Una do Espírito, que lhe permite conceber na sua entrega total e sem mácula ao Filho de Deus no seu coração, como no seu seio.
O coração do Filho, apenas visível depois da morte do Ego, está centrado e alinhado na composição não só com o da Mãe, visível, como também com o do Pai, invisível, simbolizando na unidade do Espírito Santo ou Luz ligando os três o exemplo da Redenção, da transubstanciada Ressurreição da Matér-ia além do desejo egoista separativo pela sua união perfeita com a vontade altruista unitária do Espírito primordial e final que contém a Matéria em que se desdobra.
Fora do campo sagrado rectangular da mandala aonde estão o Pater, a Mater, e o Filius, vemos um santo, e uma santa, a quem é permitido no entanto contactar e tocar a Divindade, pela sua proximidade desta no exercício da Caridade, ou exercício do Coração. Encarnam aqui o princípio feminino, e masculino, as duas colunas da divisão do uno que por polaridade permitem a Manifestação eternamente renovada e cíclica da Existência, polarizada sistemicamente entre o Visível e o Invisível.
A originalidade principal desta iconografia ortodoxa é representar a própria figura do Cristo como Santo ou Puro Graal, e não à côncava taça aonde José de Arimateia teria lendariamente recolhido o Seu sangue, geralmente presente na iconografia cristã ocidental. A origem da palavra Graal significou no Ocidente um prato redondo e côncavo, depois passando a designar a taça contendo o vinho simbolizando o Sangue figurativo da presença espiritual de Cristo na Eucaristia celebrada dentro da consciência individual de cada um.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

Cristóvão Colombo - uma história (in)verosímil

Com a devida vénia e por tornar evidente a incoerência de teses apregoadas, reproduz-se excerto do comentário crítico de Eduardo Albuquerque no forum Genea Portugal.

(...) Parece que o Infante D. Henrique, em idade mais adequada para pôr em ordem a “alma” pegando no terço, se deu a outras inclinações... de que teria resultado alguém que, passados cerca de trinta anos, viria a adoptar o apelido Colombo, e digo Colombo, pois foi este, segundo alguns pretendem, o mandado registar pelo nosso monarca D. Manuel I, a Rui de Pina.

Do que resulta a natural perplexidade e paradoxo de o Rei mandar registar Colombo e este adoptar Colón. Que grande ingrato...!

Mas o Infante, ter-se-á revelado muito prolífero, pois, antes do “Cristóvão” já tinha dado ao mundo um “Bartolomeu” e, depois do Cristóvão, ainda houve lugar para um “Diogo”.

Ah! grande Infante, que melhor demonstração poderia haver de um dos mais genuínos produtos da rija “cepa” portuguesa.

E, tudo consertado com os Reais Senhores, todos optaram por uma segunda profissão, a da espionagem, e todos eles se passaram a chamar Colombos, perdão, Colóns!

Dos tenros anos, da nobre prole, o nosso clero, com muito medo da terrível fogueira, nada registara... pois diziam as profecias que estavam votados à ignóbil arte da espionagem...

Mas valendo-se de científica metodologia, logo se prova que eram de sangue Real e muito possivelmente filhos do notável Infante, pois, por um lado as feições não o desmentiriam, e por outro, tal como o Infante não se interessaram pelas coisas do mar?
Logo, a conclusão surge cristalina, e a prova concludente!

Assim, depois de ter casado, como muito bem referiu o estimado confrade, com senhora de diferente “status”, como filho de príncipe que se orgulhava de ser, vai o “nosso” “Cristóvão”, depois de andar a “chatear” a família toda com o “eu quero ir à Índia”, para Castela em tríplice missão, a saber: de missionário da “Pomba”, de navegador desempregado e de régio espião. Grande “Cristóvão”! E aí, renasce como Colombo, perdão, Colón, obviamente ocultando as suas Reais origens que muito o prejudicariam.

Já em Castela, volta à sua teimosa petição “eu quero ir à Índia”, eu sou o missionário da “Pomba”, pois eu quero lá construir um pombal, para enviar mensagens secretas ao meu amo e senhor...

Tanto “chateou”, tanto “chateou”, pois a técnica comercial tinha-a aprendido no “The Sagres’s College”, muito necessária às futuras trocas comerciais, que os Reais Senhores Castelhanos, para se verem livre dele, não o mandaram dar uma “volta ao bilhar”, mas para o “ultramar”. Vai com Deus... e o Senhor te acompanhe...!

Regressou tão ufano à original pátria, publicitando tão gloriosa empresa, que com o deslumbramento, ninguém reconheceu tão ilustre e Real senhor, mas apenas viu o novo Cristóvão Colombo, perdão Colón!

E os Reais manos, em mui nobre aprendizagem, lá foram desenhando uns portulanos, pois o futuro é incerto, e o ser de condição Real, não é garantia que baste. Não houve já um Imperador que acabou em jardineiro...?

Estes manos, um pouco ingénuos, renegaram a sua Real condição, em benefício da sua nova actividade, quer de espiões de Sua Majestade, quer de criados do mano mais “furão”, o Cristóvão das Pombinhas, e mudaram de nome para Colombo, perdão, Colón, o que tudo inculca o ingresso na Ordem dos Espiões... Ordem que se tornaria famosa pela continuação deste apelido em terras de Castela “ad saecula saeculorum”...

E lá partiram para Castela, França, Inglaterra, no propósito de desviar as atenções dos Castelhanos da nossa empresa, pois os ingleses e os franceses eram muito ladinos... e convinha desviá-los para a Índia...

Infelizmente, um dos filhos do notável espião Cristóvão, dito Fernando, “o Nandinho das Escrituras”, era atrasado mental, enfim, coisas da natureza, e por isso não ingressou na Ordem, pelo que nunca soube que o pai tinha sido espião.

Vai daí, quando este morre, aquele que de suas origens nada sabia, procura testemunhos vivos, rebusca sofregamente toda a documentação deixada, lê num apêndice a um Codicilo os nomes de alguns herdeiros de certo genovês, e parte para Itália em busca de suas naturais e mui nobres origens.

E o infeliz incapaz não é que só lhe dá para procurar Colombos, nem Colóns pesquisou!

E, como incapaz que era, nada encontra de seus avós, pelo que concluiu:

Pois, se o meu pai era enviado da “Pomba”, os meus avós e todos os meus ascendentes voaram...
(...)

Eduardo Albuquerque

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Cristóvão Colombo inexplicável


Alguém, cujo nome se desconhece, casa com Filipa Moniz, nascendo dessa união Diogo Colombo.
Diogo Colombo é levado para Castela por Alguém que é seu pai.
Alguém em Castela torna-se Cristóvão Colombo.
Cristóvão Colombo por várias vezes vem a Portugal onde ninguém o identifica como o marido de Filipa Moniz.



E qual o papel de Diogo no meio de tudo isto?


Corolário em forma de aditamento (15-2-2007 1:52):

1. Filipa Moniz é tão importante que ninguém na época se lembra de fazer essa associação.
2. Cristóvão Colombo de alta estirpe da nobreza, digo, da realeza portuguesa é irreconhecível por todos os que o avistam e dele dão notícia.



Continua-se a perguntar qual o papel de Diogo no meio de tudo isto?

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

A Falácia, o Sofisma, e o Discurso Invertido na Pseudo-História

Baseando-se como sabemos a Pseudo-História, ramo da Pseudo-Ciência (5), em grande parte na falácia (1), encontrámos ser interessante e exercício muito curioso o poder definir com propriedade os seus diferentes tipos, sistematizados, de que geralmente nem nos damos conta ao percorrer textos prenhes deles. É evidente que nem só a Pseudo-História utiliza a falácia, e ademais o sofisma (4), também os discursos políticos, os enunciados jurídicos, as propagandas comerciais, e até as conversas informais deles podem abusar largamente.
O que distingue a falácia do sofisma? A intenção deliberada de enganar, presente no segundo, e que se presume estar ausente da primeira. E neste mais recente formular do conceito definindo um sofisma, pode não estar envolvida a Pseudo-História, quando apresentada de boa fé. Mas está-o sem dúvida se considerarmos apenas o mais antigo significado de sofisma (4).


Alegoria ao Sofisma, por Vanko Vukeljic

Mais curiosa ainda será uma eventual associação, que deixamos ao critério dos leitores, da falácia com a teoria do discurso invertido que recentemente veio propor o australiano David John Oates. É evidente que se se considerar apenas o discurso invertido horizontalmente, ou seja, como uma segunda comunicação real veiculada subjectiva e ocultamente do emissor ao receptor da comunicação, podemos esquecer-nos que para qualquer comunicado existe sempre a sua recepção verticalizada ad adversum, ou seja, apreendida contra o sentido do informado, aceitando-se o seu oposto.
Passamos então a transcrever a sistematização proposta da falácia (2):

"FALÁCIAS INFORMAIS - são argumentos em que as premissas não sustentam a conclusão em virtude de deficiências no conteúdo, o erro provém da matéria ou conteúdo do raciocínio.

1 . Falácias da irrelevância - As premissas não são relevantes para sustentar as conclusões.

2 . Falácias da insuficiência de dados - As premissas não fornecem dados suficientes par garantir a verdade das conclusões.

3 . Falácias da ambiguidade - As premissas estão formuladas numa linguagem ambígua.

1 . Falácias da irrelevância

- Falácia ad baculum ou recurso à força - Argumento que recorrem a formas de ameaças como meio de fazer aceitar uma afirmação.

- Falácia ad hominem ou contra a pessoa - Argumento que pretende mostrar que uma afirmação é falsa, atacando e desacreditando a pessoa que a emite.

- Falácia da ignorância - Argumento que consiste em refutar um enunciado, só porque ninguém provou que é verdadeiro, ou em defendê-lo, só porque ninguém conseguiu provar que é falso.

- Falácia da Misericórdia - Argumento que consiste em pressionar psicologicamente o auditório, desencadeando sentimentos de piedade ou compaixão.

- Falácia ad populum ou falácia populista - Criação de um ambiente de entusiasmo e encantamento que propicie a adesão a uma determinada tese ou produto, cuja origem ou apresentação se devem a uma pessoa credora de popularidade.

- Falácia ex populum ou falácia demagógica - Argumento que pretende impor determinada tese, invocando que ela é aceite pela generalidade das pessoas.

- Falácia ad verecundiam ou falácia da autoridade - Argumento que pretende sustentar uma tese unicamente apelando a uma personalidade de reconhecido mérito.

2 . Falácias da insuficiência de dados

Trata-se de proceder a generalizações, partindo de observações insuficientes ou não representativas.

- Falácia da generalização precipitada - Enunciar uma lei ou regra geral a partir de dados não representativos ou insuficientes. Este tipo de falácia pode assumir duas formas: enumeração incompleta e acidente convertido.

Enumeração incompleta - Argumento que consiste em induzir ou generalizar a partir de observações insuficientes

Acidente convertido - Argumento que consiste em tomar por essencial o que é apenas acidental, por regular ou frequente o que é excepcional.

- Falácia da falsa causa - pode interpretar-se de duas maneiras: Non causa pro causa (não causa pela causa) e Post hoc, ergo propter hoc (depois de, logo por causa de)

Non causa pro causa (não causa pela causa) - falácia que consiste em atribuir a causa de um fenómeno a outro fenómeno, não existindo entre ambos qualquer relação casual.

Post hoc, ergo propter hoc (depois de, logo por causa de) - falácia que consiste em atribuir a causa de um fenómeno a outro fenómeno, pela simples razão de o preceder. Exemplo: Se um desportista tomou certa bebida antes da competição e se saiu vencedor, pode inferir que essa bebida funciona como "poção mágica" e passar a tomá-la antes de todos os jogos.

- Falácia da falsa analogia - Forma de inferência que consiste em tirar conclusões de um objecto ou de uma situação para outra semelhante, sem reparar nas diferenças significativas.

- Falácia da petição de princípio - Forma de inferência que consiste em adoptar, para premissa de um raciocínio, a própria conclusão que se quer demonstrar.

- Falácia da pergunta complexa - Consiste em adicionar duas perguntas ou fazer uma pergunta que pressupõe uma resposta previamente dada, de modo a que o interlocutor fique numa situação embaraçosa, quer responda afirmativa ou negativamente.

3 . Falácias da ambiguidade

- Falácia da equivocidade - Consiste em introduzir num argumento um termo com duplo sentido, o que conduz a conclusões erradas.

- Falácia da divisão - Argumento que atribui aos elementos isolados uma propriedade que é pertença colectiva da classe em que esses elementos se integram.

- Falácia da falsa dicotomia - Apresentação de duas alternativas como sendo as únicas existentes em dado universo, ignorando ou omitindo outras possíveis.

- Falácia do espantalho - Consiste em atribuir a outrem uma opinião fictícia ou em deturpar as suas afirmações de modo a terem outro significado.

- Falácia da derrapagem - Argumento que, introduzindo pequenas diferenças entre cada uma das premissas condicionais ou equivalentes, leva a uma conclusão despropositada.

- Falácia de anfibologia - é uma ambiguidade sintáctica. Há anfibologia quando uma frase permite duas ou mais interpretações. Há falácia por não haver estabilidade de sentido. Muitos slogans entram nesta categoria de falácias...".

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1) Segundo o dicionário em linha Priberam, falácia vem de falar; trata-se de um s. f., expressando a qualidade do que é falaz; falatório; palração; gritaria. Palavra oriunda do latim falacia significando engano, ardil, burla.
2) Um interessante artigo contendo a sistematização das várias formas usitadas de falácia, deixou infelizmente de estar acessivel na Internet. Este facto nos levou a utilizá-lo aqui como valiosa ferramenta que convem ficar disponível para análise das várias deficiências dos textos de investigação pseudo-histórica.
3) Sobre a teoria do Discurso Invertido de David John Oates, cf. http://brazil.skepdic.com/discursoinvertido.html,
http://www.reversespeech.com/home.htm, e http://en.wikipedia.org/wiki/David_John_Oates.
4) Vidé
http://www.priberam.pt/dlpo/definir_resultados.aspx?pal=sofisma, e http://pt.wikipedia.org/wiki/Sofisma.
Na Wiki lusófona definem actualmente sofisma como sendo um "... um raciocínio aparentemente válido, mas inconclusivo, pois é contrário às suas próprias leis. Também são considerados sofismas os raciocínios que partem de premissas verdadeiras ou verosímeis, mas que são concluídos de uma forma inadmissível ou absurda. Por definição, o sofisma tem o objetivo de dissimular uma ilusão de verdade, apresentado-a sob esquemas que parecem seguir as regras da lógica. Historicamente o termo sofisma, no seu primeiro e mais comum significado, é equivalente ao paralogismo matemático, que é uma demonstração aparentemente rigorosa que, todavia, conduz a um resultado nitidamente absurdo...".
5)
Um dos principais argumentos usitados pelos pseudo-historiadores é o de não atribuir à História a sua categoria de ciência; confundindo a inexactidão passível de existir na interpretação das fontes com o rigor empírico exigido na sua definição e manuseio. Isto deve-se também em grande parte à sua ignorância ou desprezo da metodologia exigida para os trabalhos dignos da qualificação historicista poderem ser validados pela Comunidade Científica. Confundem pois a liberdade de interpretação dos factos já documentados com o trabalho empírico da sua colheita documental e exegese crítica das fontes assim organizadas, únicas passíveis de serem utilizadas pelo historiador. A utilização indevida da palavra historiador pelos leigos tem obrigado os verdadeiros historiadores a preferirem a designação de investigadores... da mesma forma que os Doutores foram obrigados a refugiar-se no eufemismo Professor Doutor. Ao considerarem impossivel atingir-se em História conclusões seguras, exactas, ficam-se os pseudo-historiadores naquilo a que no artigo anterior chamámos de filosofia da História, ou seja, tentando alcançar a História como os filósofos procuravam alcançar a Sabedoria.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

História Colombina, ou Filosofia Colombina?

A diferença entre a História, uma ciência reconhecida como tal desde o século XIX, e a Filosofia, o núcleo restante de todo o conhecimento residual depois de dela emergidas e tornadas independentes as diferentes ciências, é consabida. Uma ocupa-se do estudo do passado da Humanidade, baseando-se não só em documentos credíveis, conjugados, depois de crivados pela sua necessária exegese crítica; a outra, dispensando as fontes, procura alcançar novos caminhos cognitivos através de especulação mental diversa, apoiando-se em novas ideias que se procuram sistematizar em diferentes modelos.

Na Filosofia, ao contrário da História, não contam primacialmente os resultados do filosofar, conta acima de tudo o próprio acto de filosofar... valoriza-se o caminho, o estar indo, o ir descobrindo, sem nunca alcançar senão parcialmente conclusões, que necessariamente hão-de ser sempre meras etapas da manifestação do conhecimento abstracto em si próprio, que se deseja ir materializando em estruturas mentais compreensíveis ao Homem. Em História, muito pelo contrário, valorizam-se acima de tudo os resultados, apresentados sempre de forma provisória, sim, mas factual e organizadamente em sistema lógico e coerente.

Se nova documentação poderá surgir posteriormente sobre um dado assunto histórico, que obrigue à sua revisão, ou interpretação, esse novo ou novos conjuntos documentais terão que formar sentido com os restantes documentos anteriormente aceites como válidos, ou de maior número ou importância. Excepto se se provar que toda essa documentação anterior era falsa ou mal interpretada, claro. Ora uma coisa é a História, ou seja, a cronologia sistematizada no tempo e no espaço dos acontecimentos conformes à melhor documentação, outra a Filosofia da História, em que nos é permitido divagar com estruturas e sistemas cognitivos que nos permitam abordar de novas formas a sistematização desses mesmos conhecimentos factuais.

Muito outro é portanto o escopo da História, a quem cabe a árdua e ingrata tarefa de explicar o passado à luz das suas fontes, permitindo-nos recolher dados com valor para a explicação do presente.

É nossa convicção profunda, diante de verborreias indiscriminadas que não têm em conta a documentação validada coerente e coesa, mas apenas o amor a "estar no caminho, cada vez mais disperso e vago, caótico, mesmo, da verdade a alcançar apenas hipoteticamente num futuro mais do que entrevisto, desejado", que a Pseudo-História Colombina do presente apenas pretende baralhar os dados, confundir os espíritos, com propósitos filosóficos de permitir sempre novas e melhores especulações baseadas sobre factos já dados como irrelevantes, mal enquadrados ou compreendidos... ou pior, agir em mera propaganda, que se queira fazer passar por historicista... junto dos leigos, e daqueles que se deixem vencer pelo cansaço dos seus argumentos contumazes que não aceitam terem ficado destruidos, depois de bastamente desmontados...

Assim, a relação da Pseudo-História para com a História tem que ver, no campo restrito do estudo da realidade passada que permite explicar-nos o nosso presente, com a mesma dissonância que desde o primeiro tempo do som uno universal (2) emergindo do silêncio cósmico mostrou ter o Caos (ou Desordem) para com o Universo (ou Ordem) (1). Uns estudam e divulgam desordenamente enquanto estudam o que ainda não sabem... e desejam seja contrário ao já dado como provado; outros aguardam e publicam apenas serenamente as conclusões factualmente irrefutáveis, ou que se crêem como tais, logicamente explicáveis e compreensíveis.

Sendo assim, e como tudo na vida, à Pseudo-História deve ser reconhecida alguma utilidade, mais que não seja porque obriga a reavaliar conhecimentos, a ordená-los, e a publicá-los de forma mais sintética e útil para proveito do esclarecimento do leigo confundido nas matérias por ela abordadas. Infelizmente, com muito raras excepções, apenas profissionais do campo da História, e talvez mesmo não todos, são disso capazes e têm tempo para tal.

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1) Universo = Versus Uno > até à unidade, i. é, à unanimidade. Em termos parúsicos, a unidade tomará forma através de uma ordem dada ao caos (ou desordem). Isto coincide com o que actualmente nos ensina a Física Quântica: que no caos (ou "sopa quântica") algo se manifesta ordenadamente apenas quando nós próprios ali concentramos a nossa atenção.
2) Aceitando-se que existe uma vibração energética cósmica produzindo um som uno durante a manifestação expansiva da matéria, no processo de dilatação cíclica dos Universos com suas Galáxias.

quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

O Ovo de Brunelleschi - ou o Fim do Pseudo-Histórico Ovo de Colombo

Monumento ao "Ovo de Colombo"

A Pseudo-História, ao basear-se em deduções não comprovadas, e contrárias ao documentado, e postas em circulação deliberadamente, pode perfeitamente, quanto a nós, ser chamada de História Boateira. O alcance, a difusão, a extensão dos estragos feitos pelo alargar do boato, são sobejamente conhecidos. Por vezes, mesmo, incapazes de reconhecer o erro total, geral e de base das suas publicações, existem algumas pessoas que passam a proceder (quando não começam logo por aí...) à publicação de documentos falsos, que se aparentem capazes de justificar teses estrambólicos ou alheias à verdade (1).
Outras vezes, o boato funciona com a indevida reproduação de informação mal compreendida e repassada sem critério, fenómeno que nos nossos dias parece poder atingir dimensões preocupantes com a Internet.


Representação, em 1630, da
cena do suposto ovo de Colombo

Curiosamente, um dos mais antigos exemplos de como a História do Boato se pode conseguir tornar "verdadeira" na crença geral por longos séculos, é exactamente o mito do chamado Ovo de Colombo... que parece afinal descobrir-se ter sido, sim, o Ovo de Brunelleschi. O ovo foi um exemplo que este arquitecto florentino utilizou cerca de 1445, para exemplificar aos ignorantes da arquitectura na cidade a forma que estava a imprimir ao zimbório da catedral de Florença (2).

O seu compatriota Girolamo Benzoni (3), muitos anos mais tarde, querendo ironizar a nobreza castelhana, que não aceitava Colombo, e desprezava a falsa descoberta do caminho marítimo para a Índia por este, resolveu atribuir o episódio de Brunelleschi ao almirante das falsas Índias, numa inventada resposta a quantos castelhanos lhe menosprezariam um feito tão polémico, porque contrário ao inicialmente proposto.

Mais de dois séculos depois, Voltaire leu a obra, e crendo no que dizia, reproduziu a informação do ovo, atribuindo-a a Colombo como verdadeira, e depois dele, o erro ficou sendo repetido ad eternum, até aos nossos dias.

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1) Cf. www.pbs.org/wgbh/nova/vinland/fakes.html
2) cf. http://www.cristobal-colon.net/Dossiers/C10p1p2.htm
3) Benzoni, Girolamo, nasceu em 1519. Publicou a "Nova História do Novo Mundo: contendo a suma do que os Espanhóis fizerem até ao presente nas Índias Ocidentais & e o rude tratamento que dão a esses pobres povos... tirado do italiano de Jerónimo Benzoni Milanês, que viajou XIV anos nesses países & ...

quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Corpo Coeso de Fontes e Estudos Sobre a Naturalidade Italiana de Colombo

Curiosamente, em relação àqueles que contestam a naturalidade italiana, ou dão como não conhecida a Colombo a sua naturalidade, a única tese sobre o nascimento exacto do condottiero marítimo não aceitável é, justamente, a "tese portuguesa". Além da unanimidade das fontes e estudos de época,existem boas razões para isso. Uma das que não costumam ser referidas, é que jamais apareceu família sua portuguesa a reclamar qualquer direito aos seus bens no sc. XVI, enquanto que castelhanos e italianos, uns falsos, outros verdadeiros, foram inúmeros, dado o montante e o relevo desses bens. Também o testemunho de Rui de Pina, que o conheceu pessoalmente, não deixa muitas margens para dúvida, não tendo sido no entanto o único português do seu tempo que o conheceu pessoalmente... Defendem no entanto incansavelmente os da "tese portuguesa" e do "mistério" que apenas existiu em Portugal o mesmo testemunho de Rui de Pina, e que os restantes estudos coevos são mera cópia do cronista-mor. As crónicas eram manuscritas, no entanto, não estavam impressas, e muito menos acessíveis a qualquer um... só por especial privilégio alguém poude ter licença, na época, de aceder aos cartapácios e poder lê-las. Em segundo lugar, tal afirmação é rotundamente FALSA.

Ao ser reapresentado em linha o sempiterno argumento de insuficiência documental quanto à identificação de Colombo na referida crónica de Rui de Pina, que teria sido copiado nos escritos portugueses de Quinhentos que se lhe seguiram, e reafirmando-se ainda com contumácia que o aventureiro Colom em Castela não era o mesmo Colombo que residira anteriormente em Portugal, reiterando-se outrossim que o nome Colombo não deu em Castela por apócope as palavras Colomo, e Colón, como toda a historiografia castelhana sempre reconheceu aliás, víamo-nos aqui obrigados ao trabalho escusado de recensear uma boa maioria de fontes e estudos coevos de Colombo, a fim de salvaguardar leitores incautos e menos informados de cairem em dúvida quanto a este argumento incorrecto, e demagógico.


Este trabalho de recenseamento estava no entanto já suficientemente feito pelo sr. Coelho,
esclarecido interveniente no fórum Génea Sapo, a quem pedimos escusa para aqui, com melhor
evidência e acessibilidade na net, o reproduzir, reunindo-o dos vários posts dispersos em que se
encontrava colocado.

1. Quanto a apenas existir o testemunho de Rui de Pina sobre o uso em Portugal do nome Colombo, depois disso sempre copiado pelos estudos quinhentistas portugueses seguintes, e quanto ao facto evidente e indiscutível de que Colombo, Colomo, Colom e Colón são diferentes formas porque no seu tempo foi denominado indiferentemente, consoante os países, o futuro almirante "descobridor do caminho marítimo para a Índia... de Castela", refere o Sr. Coelho (1) uma apesar de tudo não exaustiva, mas suficientíssima na demonstração do ponto.

Lista de 22 referências documentais escritas por contemporâneos de Colombo

1486, Alonso de Quintanilla – Colomo
1487 (Agosto), Francisco González, de Sevilla – Colomo
1487 (Maio), Francisco González, de Sevilla – Colomo
1487 (Outubro), Francisco González, de Sevilla – Colomo
1488, Dom João II – Collon, Colon (esta, aduzimos nós, PHC, por estudar e comprovar no único documento conhecido).
1489, Isabel a Católica – Colomo
1492, Capitulações - Colon (estas, sitas no Arquivo da Coroa de Aragão, terão sido traduzidas
segundo segundo alguns pensam do catalão para o castelhano, sendo que na primeira língua, texto desaparecido, deveria estar, coerentemente, também Colom ou Colomo).
1493, Duque de Medinaceli - Colomo
1493, R.L. de Corbaria – Columbo
1498, Pedro de Ayala – Colón
1498-1504, Rui de Pina – Collombo, Colombo
1500-1501: Pedro Martir d’Anghiera – Colonus
1501, Angelo Trevisan – Columbo, Colombo
1502, O anónimo do planisfério de Cantino – Colonbo
1513, Andrés Bernaldez – Colon
1516, Hernando Alonso de Herrera – Colon
1519, Jorge Reinel – Colombum
1523-1566, Bartolomé de las Casas – Columbo de Terrarubia, Colon (PHC: obra segundo a qual também existe a tese, ainda por comprovar, de ter sido inicialmente escrita em catalão, com subsequente tradução para castelhano, alterando se assim for decerto a denominação escrita do almirante).
1525, Gaspare Contarini – Colombo
1530-33, Garcia de Resende – Colombo
1535-1557, Gonzalo Fernandez de Oviedo y Valdés – Colom
1539, Fernando Colombo – Colon (aqui o sr. Coelho não teve em conta que a obra do filho, em manuscrito, desapareceu, conhecendo-se dele a 1ª impressão em italiano, de 1571, que refere Colombo e não Colón)."

2. Quanto aos inúmeros testemunhos nas fontes, independentes entre si, de coevos do aventureiro, sobre a sua naturalidade italiana, refere ainda ali o sr. Coelho, a quem de novo gratamente brindamos pelo trabalho que assim nos evitou:


Anteriores ao testemunho de Rui de Pina, pelo menos estas fontes estrangeiras

1493, Pietro Martire d’Anghiera – lígure
1494, Pietro Martire d’Anghiera – lígure
1497, Pietro Martire d’Anghiera – lígure
1498, Pedro de Ayala – genovês
1500-1501: Pedro Martir d’Anghiera – ligure
1501, Nicoló Odereco – cidadão de Génova
1486, Alonso de Quintanilha – estrangeiro
1487 (Maio), Francisco González de Sevilla – estrangeiro
1498-1504, Rui de Pina – italiano
1500-1501: Pedro Martir d’Anghiera – ligure
1501, Nicoló Odereco – cidadão de Génova


e contemporâneas de Rui de Pina, e de Colombo, as fontes

1519, Jorge Reinel – genuensem
1530-33, Garcia de Resende – italiano
1513, Andrés Bernaldez – de Milão
1516, Hernando Alonso de Herrera – genovês
1523-1566, Bartolomé de las Casas – genovês
1525, Gaspare Contarini – genovês
1535-1557, Gonzalo Fernandez de Oviedo y Valdés – Ligúria, concretamente Cogoleto, ou então Savona ou Nervi.
1539, Fernando Colombo, seu filho e biógrafo – genovês.

"...E, volto a dizer, não tem um único autor contemporâneo que tenha afirmado que Colombo era natural de outra qualquer região que não da moderna Itália. Alguns dos autores citados conheciam Colombo pessoalmente. No mínimo, a maior parte deles conhecia gente que conhecia Cristóvão Colombo pessoalmente...".

Mas ainda antes de sair do tema, que desejamos definitiva e completamente esgotado, aditemos ainda outra versão mais desenvolvida das mesmas fontes em conjunto compacto e coeso, acrescida já das necessárias referências bibliográficas, que o inestimável sr. Coelho teve a bondade de coligir a favor da clareza mental dos crentes na "tese portuguesa":

Fontes Portuguesas coevas sobre a italianidade de Colombo

1498-1504, Rui de Pina, cronista desde 1490, integrou a comitiva portuguesa que se deslocou a Castela para negociações resultantes da primeira viagem de Cristovão Colombo: “Descubrimento das ilhas de Castella por Collombo: … Christovam Colombo, italiano, …” (Chronica del Rey D. João II, cap. 66) (Graça Moura, p. 91-92; Taviani, 1991).
1502, anónimo, no planisfério dito de Cantino: “As Antilhas del Rey de Castella descobertas por Colonbo almirante” (PMC, estampa 5) (apud Graça Moura, p. 93).
1519, Jorge Reinel, mapa: “Xpoforum colombum genuensem” (PMC, estampa 12) (Graça Moura, p. 93).
1530-33, Garcia de Resende, moço de câmara, confidente e biógrafo de Dom João II: “De como se descubriram per Colombo as Antilhas de Castella: Christouao Colombo, italiano.” (Chronica dos valerosos e insignes feitos del Rey D. João II) (Moura, p. 91-92).
1552: João de Barros: “Segundo todos afirmam, Christouão Colom era genoes de naçam” (Décadas da Ásia, Primeira, Liv. III, cap. XI) (Graça Moura, p. 93). “How into this reign came Christopher Columbus of Genoa, who came from his discovery of the western islands that are now called the Antilles” (Taviani, 1991).
1540, Damião de Góis: “Em sua vida [de Dom João II], o genovês Colombo ofereceu-lhe seus serviços» (Fides, Religio, Moresque Aethiopum) (Graça Moura, p. 94).
1550 (publ. 1561), Gaspar Barreiros: “duce Christophoro Colono ligure” (Commentarios de ophyra regione …) (Graça Moura, p. 94).
1557 (anterior a), António Galvão: «No anno de 1492 … despachou Christouam Colom, italiano, com três nauios ao descobrimento da noua Espanha …» (Tratado dos Descobrimentos) (Graça Moura, p. 95). Galvão usa indiferentemente as formas: Colom, Colõ e Columbo.
1574, Damião de Góis: “Columbus of Genoa, a man expert in the nautical arts” (De Rebus Aethiopicis in De Rebus Oceanicis et Novo Orbe, Cologne, 1574, p. 455). No índice: “Columbi genuensis, alias Coloni commendatio” (Taviani, 1991).
1580, João Matalio Metelo Sequano: “Christophorus ergo Columbus prouincia Ligur vrbe vt aiunt, genuensis, qui Maderam inhabitabit” (Graça Moura, p. 95).
1580: Fernão Vaz Dourado: “terrae antipodvum regis castele inven[t ]a Xtoforo Colvumbo ianvensi” (Atlas, fol. 8) (PMC, estampa 249) (Graça Moura, p. 96).
1591 (anterior a): Gaspar Frutuoso: “italiano, genoês, chamado Christovam Colon, natural de Cugureo, ou Narvi, aldeia de Génova, de poucas casas, avisado e prático na arte da navegação, vindo de sua terra à ilha da Madeira, se casou nela, vivendo ali de fazer cartas de marear” (Livro Primeiro das Saudades da Terra) (apud Graça Moura, p. 96).


Fontes coevas castelhanas sobre a italianidade de Colombo

1486, Pedro Díaz de Toledo, segundo Manuel Rosa em fórum GP, chamou "Português" a Colombo - (comentário de PHC: tendo acabado de chegar de Portugal, sendo desconhecido em Castela, súbdito do rei de Portugal, é possível que esta única fonte inicial o tenha designado esta primeira vez, na sua real insignificância, como português, erro imediatamente corrigido logo depois. Mas como Toledo foi aditado à lista do sr. Coelho pelo sr. Manuel Rosa, é de não nos fiarmos muito... e confirmar esta desconstextualizada fonte quem tenha paciência para isso).
1487, Francisco González, de Sevilha:
1. “5 Mayo, di a Cristobal Colomo, extranjero, tres mil maravedis, que está aqui faciendo algunas cosas complideras el servicio de sus Altezas, por cedula a Alonso de Quintanilla, con mandamiento del obispo” (de Palencia). (Libro de Cuentas Francisco González de Sevilla, Tesorero de la R.C. (na web)).
2. “27 Agosto. En 27 de dicho mes di a Cristobal Colomo cuatro mil maravedis para ir al Real, por mandado de sus Altezas por cedula de Obispo. Son siete mil maravedis con tres mil que se le mandaron dar para ayuda de su costa por otra partida de 3 de julio.” (Libro de Cuentas Francisco González de Sevilla, Tesorero de la R.C. (na web)).
1489, Isabel a Católica - «Cristóbal Colomo ha de venir a esta nuestra corte e a otras partes e logares destos nuestros Reinos... por ende Nos vos mandamos que cuando por esas dichas cibdades, e villas e logares se acaesciere, le aposentedes e dedes buenas posadas en que pose él e los suyos sin dineros, que non sean mesones; e los mantenimientos a los precios que entre vosotros valieren por sus dineros. E non revolvades (no inquietéis) ni con él, ni con los que llevase consigo, ni con algunos dellos roídos (¿pobres?)». (Cédula de 12 de mayo de 1489, firmada en Córdoba, in Navarrete, doc. dipl. número IV – www cervantesvirtual com).
1493, Duque de Medinaceli - «No sé si sabe vuestra Señoría como yo tuve en mi casa mucho tiempo a Cristóbal Colomo, que se venía de Portogal, y se quería ir al Rey de Francia, para que emprendiere de ir a buscar las Indias con su favor y ayuda, …» (Carta ao Arcebispo de Toledo, 19 de Março de 1493 – www cervantesvirtual com).
1498, Pedro de Ayala, embaixador espanhol em Londres: “El descubridor [Caboto, hoje conhecido como John Cabot] es otro genovés, como Colón” (carta aos reis católicos Fernando e Isabel sobre as descobertas de John Cabot) (Taviani, 1985).
Bartolomé de Las Casas:
1. “...Fue, pues, este varón escogido de nación ginovés, de algún lugar de la provincia de Génova; cuál fuese donde nació o qué nombre tuvo el tal lugar, no consta la verdad dello más de que se solía llamar antes que llegase al estado que llegó Cristóbal Columbo de Terrarrubia, y lo mismo su hermano Bartolomé Colón, de quien después se hará no poca mención...” (Historia de las Indias, Liv. I, cap. II, publ 1875 – www cervantesvirtual com) - Nota: Quinto, em Génova, foi conhecido como Terrarossa, que castelhanizado deu Terrarubia (Taviani, 199).
2. Giovanni Antonio Colombo: trata-se de um parente italiano de Colombo que foi capitão de um dos navios da terceira viagem às Antilhas, em 1498. Diz dele Las Casas: «era genovés, deudo (=criado) del Almirante, hombre muy capaz y pudiente, y de autoridad, y con quien yo tuve frecuente conversación» (Historia de las Indias, lib. I, cap. CXXX).
1533, Francisco Lopez de Gomara: “Quién era Cristóbal Colón: Era Cristóbal Colón natural de Cugureo, o como algunos quieren, de Nervi, aldea de Génova, ciudad de Italia muy nombrada. Descendía, a lo que algunos dicen, de los Pelestreles de Placencia de Lombardía.” (Historia general de las Indias).
1535-1557, Gonzalo Fernandez de Oviedo y Valdés: “Viviendo Domínico Colom, su padre, este su hijo, seyendo mancebo, e bien doctrinado, e ya salido de la edad adolescente, se partío de aquels sua patria” (Historia general y natural de las Indias) (Graça Moura, p. 22). Outra passagem em versão inglesa: “Christopher Columbus, according to what I have learned from men of his nation, was originally from the province of Liguria, which is in italy, where the city and the Seignory of Genoa stands: some say that he was from savona, others that he was from a small place or village called Nervi, which is on the eastern seashore two leagues from the selfsame city of Genoa; but it is held to be more certain that he may have been originally from Cugurreo (Cogoleto) near the city of Genoa.” (Historia general y natural de las Indias, livr. 3, cap. 2) (apud Taviani, 1991).


Fontes coevas italianas sobre a italianidade de Colombo

1493-1497, Pedro Martir d’Anghiera, humanista milanês, capelão de Isabel a Católica, vivo até 1526, diz que Colombo era lígure em quatro cartas dirigidas ao Conde de Tendilla (1493), ao cardeal Ascanio Sforza Visconti (1493), Giovanni Borromeo (1494) e Pomponio Leto (1497).
1500-1501, Pedro Martir d’Anghiera, após contacto pessoal e directo com Colombo: “Christophorus Colonus, quidam ligur vir …” (Decades de Orbe Novo, publicada em 1511) (Graça Moura, 1991; Taviani, 1991).
1501, Nicolo Oderico, embaixador da República de Génova em Castela: “our fellow citizen, illustrious cosmographer and steadfast leader” (carta aos Reis Católicos) (Taviani, 1985).
1501, Angelo Trevisan, secretário de Domenico Pisano, enviado veneziano a Castela: “io ho tenuto tanto mezo che ho preso partica et grandissima amicitia cum el Columbo, … Christoforo Colombo zenovese, homo de alta et procera statur, rossa, de grands ingegno et faza longa” (carta a Domenico Malipiero, membro do conselho da cidade de Veneza) (Taviani, 1985).
1525, Gaspare Contarini, embaixador de Veneza em Castela e Portugal: “This admiral (Diego) is son of the genoese Columbus” (carta ao senado da cidade de Veneza).

A terminar, consideremos a confusão que entre os leigos e amadores da História, cegos partidários da tese portuguesa pela sua incapacidade demonstrada de gerir e integrar as fontes e estudos que não podem ser desprezados, se instalou pela má leitura de quanto o filho Fernando Colombo relata claramente na sua biografia do pai quanto ao seu sobrenome e origens em Itália; como também ainda o simplicissimo facto de uns designarem ao Colombo por genovês, e outros por milanês, que foi já objecto de outro nosso artigo aqui no PHC. Sobre este assunto, aliás, uma simples consulta a uma enciclopédia, quaisquer simples noções gerais de história italiana da época que pretendem estudar, teriam chegado para o deslindar facilmente.

Pois diante de factos, não há argumentos: apenas a mistificação aplicada deliberadamente consegue explicar a teimosia de se insistir rocambolescamente num Colombo de naturalidade portuguesa. Aparenta isto já ser uma doença do foro obsessivo com reflexos nas misteriosas e irracionais crenças dos pacientes por ela atingidos. Pelo que saindo do nosso foro de competência
profissional, não voltaremos sequer a este assunto, que consideramos pura perda de tempo, já que acreditamos necessário continuar a investigar serenamente os problemas da naturalidade e família de origem italianas de Colombo, segundo as várias teses fundamentadas disponíveis, o que não é decerto o caso da auto-chamada tese portuguesa.

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1) http://www.cristobal-colon.net/Colon/Colon_portugais.htm
2) Documentos sobre Cristóvão Colombo