Um dos mais radicais dos desenvolvimentos da política de sigilo (que teve, de qualquer forma, um longo curso na historiografia portuguesa) disse precisamente respeito à figura de Cristóvão Colombo. Em artigo publicado em 1935, Armando Cortesão defendeu a tese de que Colombo não passava, afinal, de um agente secreto ao serviço de D. João II, enviado por este aos Reis Católicos (23). Com que objectivo? Estando D. João seguro de que o caminho marítimo para a Índia era mais curto fazendo o contorno do continente africano, Colombo teria sido incumbido de convencer Fernando e Isabel a seguirem a rota ocidental. Os conhecimentos geográficos dos Portugueses garantir-lhes-iam que por esse lado o acesso à Índia era muito mais moroso, e o rei português ficaria com as mãos livres para prosseguir o seu plano.
A ideia não era completamente nova, e aparentemente só a notoriedade de Armando Cortesão, que acabava de publicar uma obra imensa que o impôs de imediato como um dos grandes historiadores da cartografia do seu tempo, a relançava com créditos reais (24).
Pode todavia argumentar-se que seria este um escrito de juventude, relativamente falando, aliás retomado num outro artigo publicado em inglês dois anos depois, com um título sugestivo: «The mystery of Columbus» (25). Sucede porém que A. Cortesão o incluiu na colectânea de Esparsos que deu à estampa em Coimbra em 1974 (26). Quer dizer que quase quarenta anos depois, e não obstante tudo o que fora entretanto dito em contrário, continuava convencido da justeza de uma tese que praticamente era então defendida apenas por seu irmão, se considerarmos somente os historiadores dos descobrimentos de maior renome.
A talhe de foice, convém acrescentar que não nos interessa aqui retomar um assunto que muito recentemente voltou à baila: o da nacionalidade portuguesa (de entre as várias que são reclamadas...) de Cristóvão Colombo. Surpreendentemente, a suposta cidadania portuguesa de Colombo e a sua qualidade de agente secreto de D. João II têm sido por vezes consideradas como uma espécie de relação de causa e efeito. E surpreendentemente porque, como é óbvio, nada tem a ver uma coisa com a outra: não é a nacionalidade que traça o destino da fidelidade dos espiões, sejam estes verdadeiros ou falsos. Colombo poderia perfeitamente ser italiano, maiorquino ou outra coisa qualquer, e, se fosse esse o caso, estar ao serviço do Príncipe Perfeito.
O problema em causa tem a ver com um aparente paradoxo: a convivência de Colombo com os meios náuticos portugueses durante largos anos, e as convicções geográficas do genovês, que indubitavelmente estavam aquém do que se pensava naqueles meios.
Não é novidade alguma que Colombo laborou no que é amiúde chamado o erro mais fecundo da história. Supondo que o valor do grau de meridiano terrestre era de cerca de 14 léguas e da mesma forma que o cartógrafo Paolo Toscanelli acertava ao propor a distância de 130º entre a Europa e a Ásia, o que em Portugal se sabia no seguimento de uma consulta que lhe fora feita a pedido de D. Afonso V, o genovês foi por força levado a pensar que esse era o caminho mais curto para o Oriente (erro a que acrescentou um outro, o do valor que tomou para a milha marítima). Ora o certo é que a marinharia portuguesa atribuía ao grau do meridiano valores mais próximos da realidade: 16 2/3 léguas, normalmente, 17,5 léguas nos finais do século XV, e Duarte Pacheco Pereira aproximou-se ainda mais com as 18 léguas que avança no Esmeraldo de Situ Orbis (27), obra que redigiu entre 1505 e 1508 segundo Joaquim Barradas de Carvalho.
O valor de 17,5 léguas vulgarizou-se rapidamente, mas convém aqui deixar claro que o proposto por Duarte Pacheco não encontrou eco em Portugal senão na Arte de Navegar de Manuel Pimentel (1712) (28). Apesar de tudo compreendem-se as diferenças em causa em relação aos c. de 111 kms. do grau de meridiano, correspondentes a 18,75 léguas marítimas portuguesas.
A presença de Jaime de Maiorca em Portugal e o início da cartografia portuguesa c. 1445, de acordo com Charles Verlinden, não podiam por outro lado deixar de fazer crer aos mareantes portugueses que a distância de 130º a que aludimos atrás estava muito aquém dos 220º que efectivamente separam a Europa e a Ásia pelo ocidente. Tudo junto, portanto, só pode ter uma explicação ainda de acordo com os defensores do sigilo: Colombo foi deliberadamente induzido em erro quanto àquilo que a coroa portuguesa efectivamente pensava em relação ao caminho marítimo para o Oriente (enunciado que é contraditório com a ideia de que seria um espião português; nesse caso, não faria sentido pensar-se que tivesse sido enganado).
Não cremos que se possa aceitar que Colombo pudesse ter deixado de saber o que pensavam os marinheiros portugueses a este respeito. Quer porque viajou com eles para a costa de África, quer por via do acesso aos papéis de um dos homens que navegou no tempo do infante D. Henrique: Bartolomeu Perestrelo, primeiro donatário da ilha de Porto Santo, cuja filha Filipa veio a ser mulher do genovês e mãe de seu filho Diogo. Quer ainda porque um homem interessado nas coisas do mar teve de certeza muitas oportunidades de reforçar esses contactos durante o tempo em que esteve estabelecido em Lisboa como cartógrafo, juntamente com seu irmão Bartolomeu.
Seria possível apesar de tudo que Colombo não se tivesse apercebido do erro em que laborava, ao tomar conhecimento das concepções geográficas então em curso nos meios náuticos ligados às navegações portuguesas? Esta questão crucial é em certo sentido uma falsa questão. E isto por várias razões.
Em primeiro lugar dificilmente se pode pôr o problema de existirem concomitantemente concepções geográficas «certas» e «erradas». É claro que essa classificação é hoje, para nós, um exercício de estilo fácil, face aos nossos próprios conhecimentos actuais. Mas nos finais do século XV corriam paralelamente e com créditos não necessariamente muito diferentes concepções que misturavam ou separavam a geografia herdada da Antiguidade (ou as geografias, para sermos exactos), a geografia imaginária da Idade Média, como a expendida Livros de Maravilhas, ou a geografia (ainda de resultados muito parcelares) emergente do contacto dos Portugueses com os territórios com que iam tomando conhecimento, na costa africana ou nas ilhas atlânticas.
O facto de Colombo dar crédito ao italiano Toscanelli – que por seu turno creditava a Marco Polo, como o fazia também o genovês – nada tinha de extraordinário, e constituía uma opção pacífica, no sentido em que era perfeitamente legítima, no quadro do saber geográfico da época. A construção da visão do mundo que tornaria evidente o erro de Colombo era ainda uma tarefa que ensaiava os primeiros passos.
E esses passos tão pouco foram imediatos. Vejamos apenas dois exemplos, tirados da náutica portuguesa, que ilustram os embaraços e dificuldades bem próprios desta matéria.
O primeiro caso que podemos invocar é o da questão das Molucas. Afirmada a necessidade de prolongar o semi-meridiano de Tordesilhas para resolver o problema da soberania deste rico centro produtor de cravo, que tanto interessava a qualquer das coroas ibéricas, os diplomatas de D. João III conduziram as negociações com extremo tacto, porquanto era convicção dominante entre os peritos ao serviço do rei português que as Molucas pertenciam de facto a Carlos V. Como não havia processo de determinar a longitude no mar com o rigor necessário para resolver a pendência sem margem para dúvidas (o método adequado só viria a ser testado com sucesso na segunda metade do século XVIII), D. João III acabou por pagar uma soma fabulosa pela soberania de um território que na realidade lhe pertencia de facto, segundo o critério de Tordesilhas alargado para o Oriente. Convencido, quase seguramente, de que estava a fazer um bom negócio (29).
O segundo exemplo é o do padre Fernando Oliveira: este teórico da marinharia (que foi também piloto de galés, teórico de construção naval e cartógrafo) propôs 20 léguas para o grau de meridiano numa obra que redigiu na primeira versão em 1570, e que se conserva manuscrita. E fê-lo, deve acrescentar-se, com uma notável virulência contra os pilotos ou matemáticos que usavam ou defendiam que se usasse um valor inferior, quando as 20 léguas marítimas portuguesas acusavam em relação ao valor real exactamente a mesma margem de erro que as 17,5 léguas então em curso, só que desta vez por excesso (30).
Quer dizer: nenhuma destas questões era propriamente um dado que se pudesse dar por adquirido urbi et orbi. A opção de Colombo estava bem aquém daquilo que lhe seria possível pensar se acreditasse na prática de navegação dos pilotos portugueses (que aliás estava longe de ser unânime: muitos continuaram a empregar o módulo de 16 2/3 léguas enquanto outros se serviam do de 17,5). Simplesmente não o fez. Preferiu insistir no resultado que lhe aparecia em consequência dos estudos profundos a que se dedicou, mas não cremos, de modo algum, que pudesse estar completamente alheado do que se passava a bordo dos navios de D. João II. Mesmo que disso tivesse um conhecimento imperfeito, é duvidoso que abandonasse as conclusões que foi construindo com o correr dos anos, para mais alimentadas como eram por um carácter marcado por uma notável pertinácia; como é inquestionável, e o demonstra todo o processo negocial que culminou com as capitulações assinadas em Espanha.
A permanência de Colombo em Portugal é concomitante com o desenvolvimento dos preliminares do projecto de alcançar a Índia que D. João II perseguia com uma tenacidade não menos notável. E desde o retorno de Bartolomeu Dias, em finais de 1488, a única questão que se punha ao monarca português era a reunião das condições necessárias para garantir o sucesso do seu plano. Reside aqui, de resto, a explicação para o hiato que referimos atrás: seria um contra-senso enviar uma armada para a Índia logo depois da viagem de Dias, sem estarem devidamente precatadas essas condições técnicas (o tipo de navios empregues, como vimos, foi diferente, e as naus de Vasco da Gama foram construídas expressamente para a viagem, como no-lo diz o cronista da Índia Gaspar Correia (31)), políticas e diplomáticas.
Por outro lado a viagem de Bartolomeu Dias não era em si suficiente. Enquanto planeava as viagens marítimas D. João II enviava emissários por terra a saber notícias do Oriente. Os dois primeiros, frei António de Lisboa e Pêro de Montarroio, fracassaram na missão que lhes fora confiada por não dominarem a língua árabe. Esse estranho erro não foi cometido com Afonso de Paiva e Pêro da Covilhã, que saíram de Lisboa em 1487, por terra, portanto no mesmo ano em que Dias zarpava em busca do extremo sul do continente africano.
Foi só em 1492, ou talvez no ano seguinte, que D. João II recebeu pela mão de mestre José, um seu enviado que encontrara Pêro da Covilhã no Cairo (Afonso de Paiva faleceu entretanto), o circunstanciado relato que aquele enviou ao rei, segundo se supõe com boas razões, dando conta das viagens que fizera entretanto pelo Oriente (32).
Só nessa altura o Príncipe Perfeito tinha então as notícias de que carecia para poder enviar uma armada à Índia. É porém sabido que o rumo dos acontecimentos impediu, por vários motivos diferentes, que esse desiderato fosse cumprido desde logo. Um deles precipitou-se quase de imediato.
A 4 de Março de 1493 a frota de Cristóvão Colombo, vinda da viagem de descobrimento da América, entrava no rio Tejo. D. João II encontrava-se perto de Santarém, onde o mandou ir ter, para afirmar ao genovês que as terras por si descobertas se encontravam no senhorio da Guiné, pertença do rei de Portugal pela letra do tratado das Alcáçovas firmado em 1479.
Rui de Pina ocupou-se do episódio no capítulo LXVI da Crónica de D. João II (33). Estamos em crer que as parcas linhas que dedicou ao assunto são muito mais eloquentes do que parecem a uma primeira leitura.
Tanto quanto Colombo estava convencido que chegara ao Cataio, estava D. João ciente de que o navegador nem chegara lá perto. Isso parece-nos evidente, sobretudo porque é de calcular que as recentes novidades de Pêro da Covilhã comprovassem a crença do monarca português na justeza de que o caminho que procurava era aquele pelo qual mandava os seus navegadores. Não obstante, segundo Rui de Pina, o rei teria lamentado não ter dado ouvidos a Colombo quando ele se propusera, havia anos, fazer esta mesma viagem ao seu serviço. O que é muito pouco provável.
Efectivamente o cronista dá-nos uma ideia do que pode ter sido a audiência que o rei concedeu ao involuntário descobridor da América. Seguro do seu êxito «o dito Almirante, por ser de sua condição um pouco alevantado, e no recontamento de suas coisas, excedia sempre os termos da verdade, fez esta coisa, em ouro, prata, e riquezas muito maior do que era» (34).
Se em relação às miríficas riquezas que Colombo esperava encontrar no seu Cataio a viagem fora de facto um fracasso completo, o almirante não podia deixar de afirmar o contrário, que sem dúvida esperava confirmar posteriormente. Certo da razão que afirmara contra todos com espantosa pertinácia, terá usado mesmo de alguma insolência para com o rei de Portugal (numa atitude que tinha o seu quê de político, sem dúvida, pois não lhe era permitida, nas circunstâncias em que se encontrava, a mínima hesitação); e este foi instado por alguns dos seus cortesãos a pura e simplesmente eliminar o genovês (35).
D. João II, que dirigiu os negócios internos e externos do país com mão de ferro, não teria evidentemente qualquer pejo em o fazer se isso fosse a medida mais aconselhável. Pelo contrário, não só não deu ouvidos aos seus conselheiros como deixou Colombo ir em paz. Nunca o faria se visse posto em causa o plano que arquitectava madura e longamente, para mais numa altura em que estava à beira do sucesso.
Voltemos um pouco atrás no curso dos acontecimentos, e não nos esqueçamos que Colombo estava em Lisboa quando Bartolomeu Dias voltou em 1488 da viagem em que dobrou o cabo da Boa Esperança. Nesse mesmo ano voltara a insistir com D. João II para que este apoiasse o empreendimento que planeava. O rei garantiu-lhe nessa ocasião, como lhe fora pedido, que podia voltar a Lisboa sem ser molestado (Colombo temia ser preso caso entrasse na capital portuguesa, por razões que desconhecemos), negando-lhe porém e novamente o seu apoio.
Dois factos são indesmentíveis. Por um lado a D. João II não moveu qualquer animosidade contra o genovês, nem antes nem depois da primeira viagem deste. Por outro, também não se desinteressou das viagens a ocidente, que estavam longe de lhe ser propostas pela primeira vez. O monarca não teve qualquer pejo em avalizar o pedido feito nesse sentido pelo flamengo Fernão de Ulmo (nome porque ficou conhecido em Portugal), que se associou depois a João Afonso do Estreito, simplesmente porque neste caso não estava envolvido o financiamento da expedição pela coroa – bem ao contrário de Colombo, cujas exigências eram tidas por exorbitantes.
Tudo isto reflecte o interesse, ou, mais precisamente, o desinteresse de D. João II pelo caminho marítimo do ocidente. No fundo, e numa só palavra, Colombo era inofensivo para os seus propósitos. Por isso lhe garantiu o acesso a Lisboa em 1488, por isso não obstaculizou a sua saída em 1493.
Não há neste processo sombra de sigilo de Estado: repare-se, facto que por vezes é convenientemente esquecido, que o rei não teve problemas em autorizar um estrangeiro a navegar para ocidente (em relação ao qual ninguém se lembrou até agora de dizer que fosse um espião). Porque já que não havia lugar a qualquer investimento só podia ganhar com o negócio caso a viagem do flamengo resultasse em algo de concreto.
Confrontavam-se portanto duas concepções geográficas bem distintas: a do navegador genovês ao serviço da Espanha e a do monarca português, baseado este nos conhecimentos acumulados pelos anos de experiência das navegações efectuadas e das informações que ia recolhendo (e que permitiram aos seus conselheiros Diogo Ortiz, mestre José e mestre Rodrigo concluir pela não viabilidade do plano colombino quando o ouviram pela boca do próprio e sobre ele se pronunciaram a pedido do rei), e aquele numa reflexão profunda sobre as autoridades que creditou. No quadro dos conhecimentos geográficos do século XV, como dissemos atrás, nada mais natural que a verificação de duas concepções tão opostas, que um e outro perseguiram com idêntica convicção. E a cada um couberam os méritos devidos por isso mesmo.
A primeira viagem de Colombo teve pelo menos o efeito de obrigar a uma redefinição de zonas de influência, desactualizada que estava doravante o tratado das Alcáçovas em face da descoberta da América. Em 1494, ao assinarem o tratado de Tordesilhas, tanto D. João II com Fernando e Isabel obtinham exactamente aquilo que queriam: o primeiro a soberania sobre os mares que haviam de levar as naus portuguesas à Índia, como já sabia de ciência segura; os segundos, a soberania de um novo continente cujas potencialidades se iriam revelar mais tarde (36).
É indubitável que D. João II soube anular a interferência da arbitragem parcial de Alexandre VI (e foi o próprio Jerónimo Zurita, o insuspeito cronista de Fernando o Católico, que a classificou assim no tomo V dos Anales de la Corona de Aragon (37)), ao propor que a linha divisória de Tordesilhas passasse 370 léguas a ocidente do arquipélago de Cabo Verde, e não a 100, como queria o Papa. Esta vitória diplomática encontrou eco do outro lado: a Fernando e Isabel interessava por igual que o diferendo se resolvesse, e daí que concordassem com a ultrapassagem de uma intervenção papal que lhes era favorável, e uma vez que as 370 léguas pedidas por seu primo não afectavam a soberania das novas conquistas.
Foi porém menos afortunado em relação ao termo do grande objectivo que norteou o seu reinado e teria depois consequências tão profundas para a história da Europa, a partir de então voltada definitivamente em direcção a um Oriente longínquo e ignorado: tolhido pelas inúmeras dificuldades que a política interna do reino lhe foi levantando, como a oposição da grande nobreza ou o falhanço da união ibérica, desvanecida em fumo com a morte do herdeiro da coroa D. Afonso, vitimado por um acidente ocorrido pouco depois do casamento com D. Isabel, filha dos Reis Católicos, a par dos problemas que a gestão do nascente império lhe iam levantando, esperando ainda pelas notícias dos seus viajantes e vendo-se logo depois obrigado a batalhar pelas vantagens diplomáticas sem as quais pouco tinha de seguro, D. João nunca viu partir as naus da Índia. Morreu em 1495, minado por uma doença implacável que o vergou antes de ver cumprida a viagem cuja realização perseguiu tão tenazmente e que preparou quase até ao último momento.
Onze anos depois, em 1506, na miséria e desacreditado, morria dolorosamente, tal como D. João, um homem tão visionário como ele – e foram talvez únicos no seu tempo. Sem nunca ter alcançado as riquezas do Cataio, afirmando até ao último momento que no fundo estava certo (porventura menos convencido que obrigado a manter-se coerente consigo próprio, contra toda a evidência), Colombo abriu as portas do Ocidente mas não viu também cumprido o sonho que foi a mola vital de toda uma vida.
Numa daquelas ironias em que é tão fértil, o destino não permitiu que qualquer dos dois lograsse o sucesso que perseguiram obstinadamente. Mas deixou que, cada um à sua maneira, o príncipe de Portugal e o almirante de Génova forjassem uma realidade que doravante era em tudo diferente daquilo que a Europa podia suspeitar quando anos antes dois jovens de vontade férrea se lançaram à conquista de um mundo que transformaram completamente.
«Colombo e a Política de Sigilo na Historiografia Portuguesa», Mare Liberum. Revista de História dos Mares, n.º 1, Dezembro de 1990, pp. 105-116.
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